Merval Pereira, O Globo
Nos últimos dias,
dois fatos mostram que não estamos bem nos diversos níveis de nossa
Educação. No Pisa (em português, Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes), uma avaliação internacional comparada para alunos na faixa
dos 15 anos, idade em que a escolaridade básica obrigatória na maioria
dos países está encerrada, continuamos na rabeira do mundo, apesar de
oficialmente termos melhorado em Matemática. E, na relação das melhores
universidades do mundo emergente, o Brasil tem só quatro, e na parte
inferior da tabela.
Se compararmos com China, Taiwan e outros,
estamos realmente bem atrasados. Qual o diagnóstico? O que falta fazer?
Procurei vários especialistas em Educação para uma análise da situação,
que começo a publicar hoje, iniciando pelo resultado do Pisa.
O
relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), que reúne os países desenvolvidos, afirma que a nota brasileira
em Matemática foi a que teve maior aumento entre todos os países. E
destaca que os avanços brasileiros foram conseguidos com a inclusão de
alunos, o que é mais difícil.
Foi o que bastou para que o ministro
da Educação, Aloizio Mercadante, comemorasse, dizendo que, se a foto do
momento ainda é ruim, nosso filme é bom. Mas, aparentemente, para os
especialistas, não há razões para comemoração.
Desde Arnaldo
Niskier, ex-secretário de Educação do Rio e membro da Academia
Brasileira de Letras, que lembra que nossa colocação no ranking continua
“vexaminosa”: 58º lugar, numa lista de 65 nações.
E pior, diz:
“Em Leitura e Ciências, continuamos na rabeira”. Irônico, cita um amigo
para dizer que “o grande problema da educação nacional é a falta de
tempo integral. Inclusive do ministro”.
Para alguns, a melhora do
Brasil em Matemática se deveu exclusivamente à mudança na composição de
idade dos alunos que fizeram a prova (especialmente em 2009, quando
houve um aumento maior), e, dentro de cada grupo de idade/série, não
houve qualquer aumento.
Priscila Cruz, diretora executiva do
movimento Todos pela Educação, diz que, se avançamos em Matemática, foi
bem menos do que deveríamos. E lembra que esse avanço tem sido muito
questionado: se realmente foi avanço ou fruto de mudança na amostra.
Segundo
a especialista Ilona Ferrão, seria um caso de “contabilidade criativa”
aplicada à Educação. A questão da amostra continua controversa, com
especialistas considerando as mudanças como válidas, e outros vendo
problemas de critério.
Para o sociólogo Simon Schwartzman,
presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade, que vem
debatendo a questão em seu blog, o que parece pacífico é o seguinte: “Se
houve uma melhoria, ela foi muito pequena e se deve, sobretudo, à
melhoria do fluxo escolar — o que em si não é mau, mas não há indicações
de que o ensino melhorou”.
Há ainda, segundo ele, um número
importante de jovens no grupo de idade do Pisa que ficaram fora da prova
porque estão abaixo da série que entra na amostra — 18.8% do grupo de
idade. “Se eles entrassem na amostra, o resultado seria muito pior.” Por
fim, seja como for, “não há como dizer que houve uma melhora na
qualidade da educação proporcionada pelas políticas do governo federal”.
Já
o economista Fernando Veloso, da Fundação Getulio Vargas no Rio, acha
que os resultados do Pisa são consistentes com os dados das avaliações
nacionais. “O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) também
mostra uma evolução em relação ao início dos anos 2000, mas uma
estagnação recente nos anos finais do ensino fundamental, que
correspondem à faixa etária dos alunos que participam do Pisa.
A
Prova Brasil também revela que o maior progresso ocorreu em Matemática”.
Veloso explica que a principal característica dos países que se
destacam no Pisa é que eles oferecem educação de qualidade para todos,
independentemente de sua condição socioeconômica. “Isso envolve a
combinação de três elementos. Em primeiro lugar, é preciso estabelecer o
que todas as crianças e jovens precisam aprender, e organizar o sistema
educacional de forma a atingir esse objetivo”.
Outro ponto
importante são os instrumentos de avaliação, “que devem ser utilizados
de forma sistemática para obter informações sobre o desempenho dos
alunos”. São necessárias ainda políticas específicas de apoio aos alunos
com pior desempenho.
Segundo ele, desde meados da década de 1990,
o Brasil avançou nessa direção, com a criação de um sistema de
avaliação abrangente e metas do Ideb para as escolas públicas.