O que falta ao PT e aos seus seguidores, além de ética, honestidade, caráter, vergonha na cara, etc. é coerência.
Fonte: http://gab.miltontemer.sites.uol.com.br/tribuna_debates/103.html
A corrupção e morte da cidadania
José Genoíno *
( Publicado no "Estado de S. Paulo" em 29 abr. 2000)
Na teoria republicana clássica sempre se teve como certo que a corrupção era a principal causa da decadência das repúblicas e de sua transformação em regimes tirânicos ou monárquicos. Nas democracias modernas, em nome ao combate à corrupção alguns regimes de força foram implantados.
Hoje o problema não está no fato de a corrupção poder proporcionar o fim da democracia, mas na convivência que ela estabelece com a democracia. Uma democracia doente, porque a corrupção representa uma violação das relações de convivência civil, social, econômica e política, fundadas na eqüidade, na justiça, na transparência e na legalidade. Em suma, a corrupção fere de morte a cidadania. Num país tomado pela corrupção, como o Brasil, o cidadão se sente desmoralizado porque se sabe roubado e impotente.
O cidadão sabe-se impotente porque não tem a quem recorrer. Descobre que os representantes traem a confiabilidade do seu voto, que as autoridades ou são corruptas ou omissas e indiferentes à corrupção, que os próprios políticos honestos são impotentes e que a estrutura do poder é inerentemente corruptora. Dessa impotência se firmam as noções de que "nada adianta" e de que no fundo "são todos iguais". A fixação desses sentimentos representa o fim da cidadania, pois ela se baseia na participação ativa do indivíduo na luta por direitos e na cobrança e fiscalização do poder. Quanto mais agonizante a cidadania, mais ativa se torna a corrupção. Nas condições da cidadania agonizante, o corrupto sente-se à vontade para se justificar e até para solicitar o aval eleitoral para continuar na vida política.
Em 16/4, o "Estado de São Paulo" publicou entrevistas sobre a corrupção no País com os chefes dos três poderes - o presidente da República, o presidente da Câmara dos Deputados e o presidente do Supremo Tribunal Federal -. As entrevistas causaram espanto a muitas pessoas, pois são o retrato fiel da indiferença das autoridades pela corrupção. Os chefes dos poderes se limitaram a constatar a ineficiência das instituições e a declarar-se perplexos e enojados com tanta corrupção. Não é isso que se espera de quem tem o poder de agir e de acionar os instrumentos de combate aos corruptos.
O poder no Brasil não só não age, mas protege os corruptos. Todos sabem que o problema da corrupção não se reduz apenas a uma escolha entre o honesto e o desonesto. A estrutura do poder público é corruptora. Em paralelo, a estrutura fiscalizadora - como o Banco Central, a Receita e a Polícia Federal e a esfera judicial e processual - favorece a impunidade, o que, na prática, se traduz em proteção, mesmo que involuntária, da corrupção. Mas se a corrupção, sua proteção e a impunidade se tornaram estruturais, a verdade é também que, em última instância, há uma vontade explícita de manter intacta a estrutura corruptora.
Essa vontade se manifesta de várias formas. A principal é a falta de iniciativa das autoridades constituídas. Outra ocorre pelo bloqueio das mudanças institucionais e legais que visam a ampliar e aperfeiçoar os instrumentos de combate à corrupção. Veja-se que no Congresso se tentou aprovar o fim da imunidade parlamentar para crimes comuns, a limitação do sigilo bancário e fiscal para detentores de cargos públicos, medidas de combate à elisão e à sonegação fiscal, medidas de combate à evasão ilegal e à lavagem de dinheiro, envolvendo até mesmo as famosas contas CC-5, mudanças moralizadoras da Lei Eleitoral, etc. Essas medidas foram sistematicamente derrotadas pela maioria governista, com o apoio de chefes dos poderes superiores. Em contrapartida, a Câmara aprovou o princípio que consagra o nepotismo; a Lei da Mordaça, que dificulta a investigação judicial; ampliou-se o foro especial para julgamento de autoridades e transferiu-se para foro especial o julgamento de delitos previstos na lei de improbidade administrativa, tornando-a ineficaz. Já o comando do Poder Judiciário não pode limitar-se a constatar o anacronismo do Código de Processo Civil e Criminal. Precisa propor sua reforma.
Hoje a sociedade já percebeu que a corrupção estrutural está albergada na falta de vontade de mudar e de punir e na vontade explícita de proteger. A racionalidade do cidadão não consegue compreender o porquê e o como de o processo de impeachment, o escândalo do Orçamento, a falência dos Bancos Nacional e Econômico, o desvio milionário do TRT de São Paulo, a corrupção da Prefeitura da capital paulista e de tantos outros casos de corrupção não resultarem em nenhuma prisão dos principais envolvidos. E porque a razão não consegue compreender essa medonha impunidade, o cidadão sente-se desmoralizado. A corrupção assume a condição de normalidade da vida política do País. A degradação e a ineficiência do poder público atingiram tão elevado grau que não se pode mais acreditar que, apesar de lentas, as mudanças virão.
Chegamos a um ponto em que somente uma profunda cirurgia cívico-política pode conferir ao Brasil condições democráticas e éticas de convívio social, econômico e político.
José Genoíno é deputado federal (PT-SP)
2 comentários:
Cautela, que essa alma quer reza.
Não podemos esquecer dos dólares na
cueca. Mas de qualquer maneira fica registrada uma magistral condenação de um dos companheiros das legendas do PT.
No entanto, confiar, desconfiando.
Att.
Madeiro
Laguardia ,boa noite .Não estou entendendo,este artigo foi escrito ontem à noite por algum inimigo do PT,ou foi mesmo escrito em 2000.Afinal .êle é super atual ,e tremendamente verdadeiro e lucido,só pode ter sido escrito ontem.Abraços
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